Contra a reformulação da PNAB – nota sobre a revisão da Política Nacional de Atenção Básica
A Abrasco, o Cebes e a ENSP se manifestam contra a revisão
da Política Nacional de Atenção Básica – PNAB que pode ser aprovada
ainda hoje, durante a 7ª Reunião Extraordinária da Comissão
Intergestores Tripartite – CIT, uma instância de articulação e pactuação
na esfera federal que atua na direção nacional do SUS, integrada por
gestores do SUS das três esferas de governo – União, estados, DF e
municípios. Tem composição paritária formada por 15 membros, sendo cinco
indicados pelo Ministério da Saúde (MS), cinco pelo Conselho Nacional
de Secretários Estaduais de Saúde (Conass) e cinco pelo Conselho
Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems). A representação
de estados e municípios nessa Comissão é regional, sendo um
representante para cada uma das cinco regiões no País. Nesse espaço, as
decisões são tomadas por consenso e não por votação. A CIT está
vinculada à direção nacional do SUS.
As atuais ameaças aos princípios e diretrizes do SUS de
universalidade, integralidade, equidade e participação social parecem
não ter fim.
Não bastasse o estado de sítio fiscal imposto por um governo
ilegítimo e golpista com a promulgação da EC 95 que fere de morte o SUS
ao agravar o subfinanciamento crônico, reduzindo progressivamente seus
recursos por 20 anos, agora nos defrontamos com uma proposta de
reformulação da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB).
Causa imensa preocupação a proposição de uma reformulação da PNAB num
momento de ataque aos direitos sociais estabelecidos na Constituição
Federal de 1988. A revisão das diretrizes para a organização da Atenção
Básica proposta pelo Ministério da Saúde revoga a prioridade do modelo
assistencial da Estratégia Saúde da Família no âmbito do Sistema Único
de Saúde (SUS).
Embora a minuta da PNAB afirme a Saúde da Família estratégia
prioritária para expansão e consolidação da Atenção Básica, o texto na
prática rompe com sua centralidade na organização do SUS, instituindo
financiamento específico para quaisquer outros modelos na atenção básica
(para além daquelas populações específicas já definidas na atual PNAB
como ribeirinhas, população de rua) que não contemplam a composição de
equipes multiprofissionais com a presença de agentes comunitários de
saúde. Esta decisão abre a possibilidade de organizar a AB com base em
princípios opostos aos da Atenção Primária em Saúde estabelecidos em
Alma-Ata e adotados no SUS.
O sucesso da expansão da atenção básica no país nos últimos anos e
seus efeitos positivos no acesso a serviços de saúde e na saúde da
população decorre da continuidade da indução financeira da Estratégia
Saúde da Familia sustentada ao longo do tempo e reforçada nos últimos
três anos com o Programa Mais Médicos. Resultados de pesquisas
evidenciaram, sistematicamente, a superioridade do modelo assistencial
da Saúde da Família quando comparado ao modelo tradicional. Sua maior
capacidade de efetivação dos atributos da atenção primária integral
produz impacto positivo sobre a saúde da população, com redução da
mortalidade infantil, cardiológicas e cerebrovascular e das internações
por condições sensíveis à atenção primária. Ao financiar com PAB
variável a atenção básica tradicional, a proposta de reformulação da
PNAB ameaça estes sucessos. Além de abolir na prática a prioridade da
ESF, em um contexto de retração do financiamento e sem perspectivas de
recursos adicionais, é muito plausível estimar que o financiamento
destas novas configurações de atenção básica será desviado da Estratégia
Saúde da Família.
A esta reformulação somam-se outras questões críticas do
financiamento da atenção básica decorrentes do fim dos blocos de
financiamento do SUS. Esta decisão penaliza a capacidade de indução do
SUS em favor da Saúde da Família e da Atenção Básica, não garantindo sua
prioridade nos governos municipais. Nossa crítica não contradiz a
necessária adequação da rede básica de saúde às especificidades loco
regionais, que devem ser financiadas mediante um aumento considerável do
PAB fixo, cujo valor médio nacional de R$24,00 per capita ao ano é
quase irrisório, estando muito defasado frente aos custos de manutenção e
desenvolvimento dos serviços necessários para responder às necessidades
de saúde da população. Urge majorar o PAB fixo para ampliar capacidades
e autonomia das secretarias municipais de saúde, mantendo a prioridade à
Saúde da Família.
A reformulação proposta também ameaça a presença do Agente
Comunitário de Saúde como integrante e profissional da atenção básica.
Com a expansão da Saúde da Família com cobertura de territórios em áreas
urbanas de diferentes estratos socioeconômicos faz-se necessário
fortalecer o papel do ACS, redefinindo e qualificando sua intervenção na
comunidade como agente de saúde coletiva, elo entre o serviço de saúde e
a população. O ACS conhece e reconhece as necessidades populacionais do
território e devem ser contemplados com estratégias de educação
permanente que apoiem seu trabalho de promotor da saúde, atuando na
mobilização social para enfrentamento dos determinantes sociais e em
ações estratégicas frente aos problemas de saúde da população.
Preocupante também é a implantação de modo simplificado, ou reducionista, de uma “relação nacional de ações e serviços essenciais e estratégicos da AB”. A ferramenta pode contribuir para a garantia de padrões essenciais mínimos mais qualificados e uniformes em todas as unidades básicas de saúde do país e mesmo de padrões estratégicos mais avançados de acesso e qualidade. Entretanto, cabe alertar que este dispositivo também denominado “carteira de serviços” ou “cesta de serviços” tem sido utilizado para definir oferta seletiva de procedimentos acoplada à implementação de seguros focalizados, em resposta simplificada às demandas de cobertura universal das agências internacionais. No Brasil, este instrumento poderá comprometer a integralidade da AB e do SUS se não houver um compromisso explícito de gestores e profissionais de saúde com oferta ampla e de qualidade das ações, conforme as necessidades de saúde da população.
Preocupante também é a implantação de modo simplificado, ou reducionista, de uma “relação nacional de ações e serviços essenciais e estratégicos da AB”. A ferramenta pode contribuir para a garantia de padrões essenciais mínimos mais qualificados e uniformes em todas as unidades básicas de saúde do país e mesmo de padrões estratégicos mais avançados de acesso e qualidade. Entretanto, cabe alertar que este dispositivo também denominado “carteira de serviços” ou “cesta de serviços” tem sido utilizado para definir oferta seletiva de procedimentos acoplada à implementação de seguros focalizados, em resposta simplificada às demandas de cobertura universal das agências internacionais. No Brasil, este instrumento poderá comprometer a integralidade da AB e do SUS se não houver um compromisso explícito de gestores e profissionais de saúde com oferta ampla e de qualidade das ações, conforme as necessidades de saúde da população.
Contra a reformulação da PNAB. Nenhum direito a menos! Em defesa do
SUS público universal de qualidade e pela revogação da EC 95.
27 de julho de 2017
Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde – Cebes
Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca – ENSP/Fiocruz