CARTA DE
BRASÍLIA
BRASIL
– 2018
Durante
os dias 14 e 15 de junho de 2018, em Brasília, se realizou o Fórum Nacional
de Atenção Primária à Saúde, com o tema “30 anos de SUS e 40 anos de
Alma-Ata”.
O
evento foi organizado pela Sociedade Brasileira de Medicina de Família e
Comunidade (SBMFC) e Associação Brasiliense de Medicina de Família e Comunidade
(ABMFC), com apoio institucional da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS),
Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde (DAB/MS), Secretaria de
Estado da Saúde do Distrito Federal (SES-DF), Associação Médica de Brasília
(AMBr), e colaboração da Associação Brasileira de Enfermagem de Família e
Comunidade (ABEFACO).
O
fórum teve como objetivo resgatar a história da Atenção Primária à Saúde (APS)
brasileira, discutindo os atuais desafios impostos ao Sistema Único de Saúde
(SUS), e a contribuição da Medicina de Família e Comunidade na sua
qualificação, a partir da identificação de desafios e potencialidades para
fortalecimento do SUS e APS, propondo um modelo avançado de APS para o futuro
que atenda as demandas e necessidades de saúde da população brasileira.
O evento foi pensando num momento alusivo aos 40 anos da
Declaração de Alma-Ata e 30 anos do Sistema Único de Saúde (SUS), por uma
necessidade de gerar uma reflexão coletiva sobre os avanços da implementação da
APS no Brasil, com suas fortalezas e seus desafios de superação, construindo-se
propostas concretas em vistas à consolidação de um sistema de saúde universal
com APS abrangente, ofertada através da Estratégia Saúde da Família de alta
qualidade, conformada por equipes com especialistas em Medicina de Família e
Comunidade e Enfermeiros de Família e Comunidade.
Neste
sentido, no segundo dia do fórum foram propostos 5 grupos de trabalho. Cada
grupo produziu uma série de recomendações em eixos distintos. As principais
recomendações estão descritas nesta carta, as demais serão publicadas pela
SBMFC, em um futuro breve, no formato de um documento mais amplo.
Seguem
abaixo as recomendações e considerações propostas pelos 5 grupos e apresentadas
em plenária.
Eixo
- Revisão da Declaração de Alma-Ata
Neste
eixo serão descritas apenas as considerações sobre o processo de atualização da
DECLARAÇÃO DE ALMA-ATA. As recomendações e diretrizes para a atualização da
declaração propostas durante o fórum serão incluídas institucionalmente pela
SBMFC na consulta pública que está ocorrendo e também estarão presentes no
documento mais amplo construído neste Fórum.
1 –
Destaca-se que o processo de revisão da declaração está sendo proposto em uma
única língua, o inglês, o que dificulta o acesso e a proposição de mudanças e
revisão por todos os povos do mundo.
2 –
O grupo discorda que seja imputado aos princípios da carta de Alma Ata o não
alcance da saúde para todos no ano 2000, e gostaria de evidenciar que foi a não
adoção, pelo poder estatal e pelos gestores de saúde e educação, dos princípios
de Alma Ata que afetaram negativamente o objetivo pretendido.
3 – Reitera que a Conferência Internacional sobre Cuidados
Primários de Saúde ocorrida em Alma-Ata teve e tem um papel histórico
fundamental para a mudança de paradigma na conformação de sistemas de saúde a
partir da APS, e para a construção de uma sociedade mais justa e equânime,
destacando que a saúde é um direito fundamental do ser humano.
4 –
Evidenciar que os resultados científicos construídos ao longo dos últimos 40
anos comprovam que a APS qualificada é necessária para que os sistemas de saúde
sejam resolutivos e equânimes.
5 –
Sugerir que o novo documento contenha elementos para que os países, além dos
conceitos, possam ter diretrizes operacionais essenciais para avançar na
construção de uma APS qualificada.
Eixo
- Gestão: Política Nacional de Atenção Básica - financiamento, modelos de
atenção e contratualização
1 –
Estabelecer a ESF como o modelo para a APS no país, com composição variável da
equipe de acordo com as necessidades do território e da população, permitindo a
flexibilização dos horários de funcionamento de forma a ampliar o acesso e
melhorar o cumprimento dos demais atributos deste nível de atenção.
2 –
Promover pesquisas e debates que permitam definir critérios e diretrizes para a
determinação das diferentes composições possíveis para as equipes de ESF,
considerando vulnerabilidades e especificidades dos diferentes contextos
(rurais, urbanos, indígenas, entre outros).
3 –
Manter ampliação e qualificação da ESF, expandindo o número de equipes em
municípios com baixa cobertura de ESF. Nos municípios com alta cobertura,
diminuir o tamanho da população adscrita.
4 –
Definir um percentual mínimo destinado à APS, do montante de investimentos em
saúde pelo nível estadual.
5 –
Potencializar a atuação de equipes multiprofissionais na APS.
6 – Garantia de acesso das equipes a tecnologias de
informação relevantes para o cuidado em saúde.
7 –
Interromper a desoneração fiscal para gastos privados com saúde.
8 –
Interromper os subsídios estatais para servidores públicos, de diferentes
órgãos e esferas federativas, contratarem planos privados de saúde.
9 –
Revogação da EC95 a fim de flexibilizar teto de gasto em saúde e educação.
10 –
Rever a lei de responsabilidade fiscal no que concerne a forma de gastos com
saúde.
Eixo
- Produção Científica em APS/MFC - Pós-Graduação e Linhas de Pesquisa
1 –
Identificar os programas e linhas de pesquisa para APS e MFC, buscando
diagnosticar lacunas para produção científica nacional.
2 – Realizar
estudo com metodologia Delphi de forma ampliada nacional e/ou iberoamericana
para identificação das necessidades de pesquisa.
3 –
Qualificar a participação de pesquisadores MFC, enfermeiros e demais
profissionais assistenciais da APS na rede de pesquisa em APS de forma a
induzir a pesquisa em MFC/APS na rede.
4 –
Fomentar redes de pesquisa como incubadoras de grupos de pesquisa, construindo
redes que integrem serviço, gestão e academia.
5 –
Estimular parcerias e fomento da pesquisa em MFC e APS desde a graduação até a
formação pós-graduada.
6 –
Pautar através das redes de pesquisa junto às agências de fomento (CAPES e
CNPQ) o aumento do financiamento e criação de linhas de financiamento
específicas para a MFC e APS.
Eixo - Ensino - Docência em Graduação, Preceptoria de
Residência Médica e Educação Continuada
1 –
Ampliar o número de departamentos de MFC e de concursos para professores de
MFC.
2 –
Expandir a inserção da MFC na graduação, aumentando a responsabilidade por um
número maior de disciplinas, perpassando todas as etapas do curso de Medicina.
3-
Aumentar a inserção do estudante no campo de prática da APS, supervisionado
pelo MFC.
4 –
Estimular planos de cargos e carreiras que considerem a especialidade como
requisito essencial para o médico que vai trabalhar na assistência ou docência
da APS.
5 –
Integração das residências de MFC com outras residências médicas e
multiprofissionais.
6 –
Regulamentar vagas de residência médica, levando-se em conta as necessidades e
prioridades do país, no sentido de universalização de vagas e obrigatoriedade
da residência para a prática profissional no médio prazo.
7 –
Estimular a ocupação das vagas de residência de MFC usando, por exemplo,
complementação financeira da bolsa de residência.
8 –
Estimular a ampliação de linhas de pesquisa e vagas em pós graduação (mestrado
e doutorado) para médicos de família e comunidade.
9 –
Estimular a formação específica e qualificação do preceptor de MFC.
Eixo
5 - Importância da MFC para estruturação da APS brasileira
1 –
Garantir e ampliar a representação nos conselhos e câmaras técnicas de MFC por
MFC.
2 –
Otimizar a comunicação e propaganda em relação ao SUS e a importância da APS.
3 – Estimular o apoio de MFC para equipes de APS que ainda
não contemplem esse profissional.
4 –
Considerando que a força de trabalho na APS é essencialmente de mulheres, é
importante que as especificidades destas trabalhadoras sejam contempladas na
formulação das políticas de provimento e fixação.
5 –
Revisar o componente da Lei 12871/13 (lei dos mais médicos) que trata da
residência médica, com o objetivo de garantir a universalidade e
obrigatoriedade da residência médica e um percentual de vagas em MFC de pelo
menos 40% do total.
Estas
recomendações constituem um conjunto de diretrizes político-científicas que
visam a o fortalecimento do Sistema Único de Saúde, o desenvolvimento de uma
APS forte no Brasil e o avanço e qualificação da medicina de família e
comunidade, tendo como objetivo orientar gestores dos três entes federativos,
profissionais de saúde, docentes, e a sociedade como um todo, nas atuais e
futuras reformas estruturantes da APS brasileira.
Brasília,
15/06/2018
Firmam
esta carta:
Sociedade
Brasileira de Medicina de Família e Comunidade - SBMFC
Associação Brasiliense de Medicina de Família e Comunidade -
ABMFC