Entrevista com Luis Eugênio Portela
Doutor em Saúde Pública pela Université de Montréal, possui graduação em Medicina e mestrado em Saúde Comunitária pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Foi secretário municipal da saúde de Salvador entre 2005 a 2007 e também diretor do Departamento de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde de 2008 a 2009. Atualmente, é professor do Instituto de Saúde Coletiva (UFBA), onde coordena o Programa de Economia, Tecnologia e Inovação em Saúde. Em novembro de 2012, foi eleito presidente da Abrasco para a gestão 2013-2015.
1. Como você avalia o SUS e o crescimento da Atenção Primária no Brasil?
No geral,
minha avaliação do SUS é positiva: as conquistas são muitas. Com o SUS,
milhões de brasileiros, antes excluídos por não possuírem vínculo
empregatício formal, passaram a ter direito de acesso a um conjunto de
serviços. Várias doenças passíveis de prevenção por vacinas foram e
estão controladas. A expansão dos serviços, notadamente da APS, é
significativa. Contudo, há enormes problemas que, se não superados,
podem até comprometer as conquistas já alcançadas, dos quais destaco
três: o subfinanciamento crônico, a falta de regulação do setor privado e
de suas práticas de mercantilização e financeirização da atenção à
saúde e a falta de uma
política de gestão do trabalho que valorize os trabalhadores,
estimulando a dedicação exclusiva ao setor público.
2. Como
novo presidente da Abrasco quais serão os principais desafios da sua
gestão para o fortalecimento da pesquisa em saúde coletiva no país?
No programa
da chapa com que concorremos à eleição, assumimos os seguintes
compromissos em relação ao fortalecimento da pesquisa:
a) Promover
o intercâmbio entre pesquisadores e estudantes da área de Saúde
Coletiva, por meio da realização de congressos e encontros científicos
de alta qualidade e do funcionamento regular e participativo das
comissões, dos grupos temáticos, dos fóruns e das redes da Abrasco.
b) Estreitar
laços com as associações internacionais da área da Saúde
Coletiva/Pública, em especial com a Federação Mundial de Associações de
Saúde Pública e a Associação Latino-Americana de Medicina Social.
c) Intensificar
a atuação da Abrasco junto aos órgãos governamentais envolvidos com
C&T (Ministério da Ciência,Tecnologia e Inovação e suas agências,
Ministério da Saúde, Fundações de Apoio a Pesquisas (FAPs) e associações
científicas (SBPC, Academia Brasileira de Ciências e outras) em todas
as questões referentes ao fomento à pesquisa e, em especial, no processo
de implantação da Política Nacional de Pesquisa.
d)
Apoiar a divulgação da produção científica da Saúde Coletiva, buscando a
estabilidade financeira e assegurando a transparência e a independência
editorial das revistas editadas pela Abrasco (Ciência e Saúde Coletiva e
Revista Brasileira de Epidemiologia), tornando-as mais eficientes, bem
como discutindo, junto aos editores científicos dos diversos periódicos
da área, as diretrizes de uma política de gestão da informação e do
conhecimento (comunicação científica em Saúde Coletiva), a ser
desenvolvida com a participação dos Ministérios da Saúde, da Educação e
da Ciência,Tecnologia e Inovação.
e) Apoiar
a formação de uma rede interinstitucional de editores científicos do
campo da Saúde Coletiva, moderada pela Abrasco, para a formulação e
implementação de uma Política Nacional Estratégica de Comunicação
Técnico-científica em Saúde Coletiva, com a participação do Ministério
da Saúde, Educação,Ciência, Tecnologia e Inovação e Associação
Brasileira de Editores Científicos (ABEC), para o fortalecimento dos
periódicos da área .
f) Contribuir
para ampliar a relevância social da produção científica em saúde
coletiva, estimulando a formação e consolidação de Redes de Pesquisas na
área e desenvolvendo estratégias que promovam uma maior aproximação
entre estas e as instâncias governamentais.
3. No
campo da pesquisa voltada para a APS, o que precisa ser desenvolvido
para dar prioridade, aumentar a qualidade e dar sustentabilidade ao
desenvolvimento da pesquisa em APS?
É preciso
reconhecer que dois documentos oficiais, a Agenda Nacional de
Prioridades de Pesquisa em Saúde (2004) e as Pesquisas Estratégicas para
o SUS (2011), asseguram a prioridade para a pesquisa sobre a APS. A
questão da qualidade remete, sobretudo, ao engajamento dos pesquisadores
e no seu diálogo com gestores, profissionais e usuários do SUS. Nesse
sentido, a RedeAPS é uma estratégia mais que pertinente. Quanto à
sustentabilidade, ao contrário, a situação é delicada: não há nenhuma
garantia de continuidade de investimentos na pesquisa sobre APS. Talvez a
criação de uma agência federal de fomento à pesquisa e de avaliação de
tecnologias de saúde seja uma via de construção da sustentabilidade.
4. Como a Abrasco poderia contribuir para a publicação de um maior número editais de pesquisas em APS?
A Abrasco
tem uma excelente interlocução com o Ministério da Saúde. Na gestão
anterior, sob a liderança de Facchini, foi possível estruturar a
RedeAPS, com o apoio do DAB/SAS. No momento, o desafio é envolver a
SCTIE no processo e já temos uma audiência agendada com o secretaário
Carlos Gadelha para discutir esse tema. Desde já, as sinalizações são
muito positivas.
5. Como
a Rede de Pesquisa em APS pode melhorar o acesso ao conhecimento de
estudos e pesquisas em atenção primária que contribua para o avanço do
SUS?
Através de
seu sítio na internet, a RedeAPS já tem facilitado o acesso ao
conhecimento. É claro que é importante tornar esse sítio mais conhecido,
alcançando mais pesquisadores e gestores. Contudo, o desafio é chegar
ao grande público: o conhecimento científico precisa enriquecer o senso
comum, como diz Boaventura Santos. Para isso, é importante utilizar os
meios de comunicação de massa. A Abrasco está investindo fortemente na
estruturação de um setor de comunicação, cujo objetivo principal é
exatamente esse: levar à população em geral conhecimento científico que a
ajude a tomar decisões mais bem informadas.
6. A rede de pesquisa em APS é um projeto entre DAB e Abrasco. Como fortalecer, ainda mais, a parceria entre academia e governo?
A parceria
com o Ministério da Saúde já é bem forte. O ministro Padilha, todos os
secretários do MS, além de diretores, coordenadores e técnicos têm tido
excelentes relações, baseadas na cooperação com total respeito à
autonomia da entidade. As
relações da Abrasco com outros órgãos de governo, no entanto, podem se
estreitar mais, particularmente nos setores da Educação e da Ciência,
Tecnologia e Inovação, com os quais a comunidade da saúde coletiva tem
muitos interesses comuns.
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