Fiscalização em cerca de mil unidades comprova sucateamento na Atenção Básica |
CFM apresenta dados sobre as 952 unidades fiscalizadas
“A consulta médica é uma ação elementar
em um centro de saúde, mas em 41 das unidades visitadas não tinha uma
sala para o médico atender”, denuncia o diretor do Departamento de
Fiscalização do CFM, Emmanuel Fortes. No Pará, médicos atendiam debaixo
de uma árvore. O CFM também constatou que 15% dos consultórios não
garantiam a confidencialidade da consulta e 22% das unidades não
possuíam sala de espera.
As fiscalizações foram realizadas em
ambulatórios (164), Unidades Básicas de Saúde (UBS) (118), centros de
saúde (88) e postos dos Programas de Saúde e de Estratégia da Família do
Sistema Único de Saúde (SUS). Foram avaliadas a estrutura física das
unidades, os itens básicos necessários ao funcionamento de um
consultório e as condições higiênicas. Em todos os aspectos, a situação
encontrada é preocupante.
Estrutura física - Em
relação ao ambiente físico, foi constatado que 353 (37%) das unidades
não tinham sanitário adaptado para deficiente; 239 (25%) não tinham sala
de expurgo ou esterilização; 214 (22%) não possuíam sala de espera com
bancos ou cadeiras apropriadas para os pacientes; e em 170 (18%)
faltavam sala ou armário para depósito de material de limpeza. “Não há
como realizar um atendimento de qualidade nessas condições. Como o
médico vai colher a história do paciente e fazer um bom diagnóstico numa
situação em que não há privacidade e o ambiente é totalmente
insalubre?”, questiona o conselheiro federal pelo Pará, Hideraldo
Cabeça.
Em 36 (4%) dos consultórios
ginecológicos faltavam sanitários e em 20 (2%) não era garantida a
privacidade do ato médico. “Não dá nem para imaginar uma mulher sendo
submetida a um exame ginecológico sem que sua privacidade seja
resguardada”, critica Eurípedes Souza, que faz parte da Comissão para a
Reformulação do Manual de Fiscalização do CFM. Também foram encontradas
161 unidades (17%) com instalações elétricas e hidráulicas inadequadas,
sem sala de atendimento de enfermagem (6%) e sem sanitários para
pacientes (3%).
Carlos Vital: comprovamos em números o quanto a assistência básica está abandonada
Quanto aos itens básicos de higiene, 23%
dos consultórios fiscalizados não tinham toalhas de papel; 21% estavam
sem sabonete líquido e em 6% o médico não podia lavar as mãos após as
consultas por falta de pia. “Esses são itens básicos, que, segundo a
Anvisa, não deveriam faltar em nenhum consultório”, afirma Emmanuel
Fortes.
Unidades não têm agulhas e seringas -
Mesmo sendo locais para a realização de consultas e procedimentos
básicos, algumas das unidades de saúde visitadas deveriam ser equipadas
para dar um suporte inicial a pacientes em situações graves. No entanto,
29% dos 305 estabelecimentos visitados que deveriam oferecer um
tratamento emergencial não tinham seringas, agulhas e equipos para
aplicações endovenosas.
Em 226 (74%) dessas unidades também
faltavam desfibriladores para atender pacientes com paradas cardíacas,
que também não teriam remédios para tomar, já que em 150 (49%) também
estavam em falta medicamentos para atendimento de parada
cardiorespiratória. Já 181 (59 %) dos estabelecimentos fiscalizados
também não tinham ressuscitadores manuais do tipo balão auto-inflável.
Também faltavam oxímetros (em 75%),
aspiradores de secreções ( 71%), cânulas naso ou orofaríngeas (70%),
cânulas/tubos endotraqueais (69%), laringoscópio com lâminas adequadas
(66%), sondas para aspiração (64%) e máscara laríngea (53%). Para o
conselheiro federal por Goiás, Salomão Rodrigues, a falta de condições
de trabalho faz com que haja uma quebra entre o humanismo e a técnica no
fazer médico. “A falta de condições provoca um dilema ético no médico,
que passa a exercer sua profissão de forma muito restrita, já que não
pode prescrever os medicamentos e tratamentos necessários para tratar
uma enfermidade. Nessas situações, os médicos atuam mais como pajés,
lançam mão do lado humano da medicina, já que não dispõem das condições
técnicas”, raciocina.
Em pelo menos 40% das unidades faltam instrumentos básicos para vizualisar Raios X, examinar ouvidos e estruturas oculares
Numa época em que a febre amarela e o
sarampo voltam a aparecer, 8% das unidades de saúde estavam sem vacinas e
em 5% o acondicionamento era feito de forma inadequada, em
refrigeradores sem termômetros externos. Remédios estavam em falta em 61
(6%) das unidades fiscalizadas e em 37 (4%) delas estavam sendo
distribuídos remédios com a validade vencida. Em 119 (13%) não havia
controle para a movimentação de medicamentos controlados.
Para o 1º secretário do CFM, Hermann
Tiesenhausen, a falta de infraestrutura e de insumos básicos impede que o
médico cumpra a sua função social de atender com qualidade o paciente.
“Ao final, a sociedade é a principal prejudicada, pois o médico não tem
condições de aplicar todo o seu conhecimento em prol de quem precisa da
ajuda dele”.
Informatização avança em todo o país -
A implantação do Sistema Nacional de Fiscalização do CFM começou com a
edição da Resolução nº 2.056/13, em novembro de 2013, que trouxe o
Manual de Vistoria e Fiscalização da Medicina no Brasil. O documento
apresenta uma lista com os itens que não podem faltar em ambulatórios,
centros de saúde e consultórios médicos. Com base nesta listagem, foi
formatado um software, distribuído junto com um tablet, uma máquina
fotográfica e um scanner portátil para todos os Conselhos Regionais de
Medicina (CRM), que receberam treinamentos para usar a nova ferramenta.
Durante o ano de 2014, o Setor de
Tecnologia da Informação do CFM participou do treinamento de 220
usuários, entre médicos fiscais, conselheiros, funcionários e agentes
administrativos dos CRM. Até o momento, os estados que mais usaram o
novo sistema foram Paraná, Tocantins, Minas Gerais, Alagoas, Espírito
Santo, Amapá, Goiás, Pará, Paraíba e Mato Grosso do Sul. Para implantar o
novo sistema, o CFM investiu R$ 1,6 milhão desde 2011 até este ano.
Além dos 27 tablets entregues a cada CRM no início de 2014, o Conselho
Federal adquiriu no início deste ano 73 novos equipamentos, que também
serão entregues aos CRM.
De acordo com Emmanuel Fortes, o Sistema
Nacional de Fiscalização está sendo aperfeiçoado constantemente. “Na
medida em que vamos usando é que vamos percebendo falhas. Umas delas é
que os médicos fiscais não estavam colocando todas as informações. É
preciso que eles preencham o formulário etapa por etapa”, alerta.
O presidente do CFM, Carlos Vital,
reforça a importância dos CRM na utilização do novo instrumento de
fiscalização. “Com o que já conseguimos captar é possível comprovar a
falta de estrutura da saúde no Brasil, mas temos de continuar
aprimorando o sistema e a adesão de todos é fundamental”, afirma.
Os itens constantes no Manual de
Vistoria obedecem ao que está estabelecido na RDC-50/02, resolução da
Anvisa que regulamenta os projetos físicos de estabelecimentos
assistenciais; no SomaSus, que é um sistema de apoio à elaboração de
projetos de investimentos em saúde; em portarias do Ministério da Saúde e
em Resoluções do CFM. “Não inventamos nada. Colocamos na Resolução o
que já era cobrado pelo próprio governo em seus mecanismos legais”,
ressalta Emmanuel Fortes.
CFM editará em breve Manual de
Fiscalização dos Hospitais -Â Depois de definir as regras para a
fiscalização em Unidades Básicas de Saúde e ambulatórios, o CFM vai
editar as regras para a fiscalização em hospitais, que devem constar da
nova atualização do Manual de Vistoria e Fiscalização da Medicina no
Brasil. “A nossa previsão é que até o final do primeiro trimestre de
2015 entregarmos uma proposta para o Plenário do CFM”, afirma o 3º
vice-presidente do CFM, Emmanuel Fortes, que nos últimos anos tem se
dedicado à revisão do documento.
Para Fortes, o novo manual deve alterar
substancialmente o trabalho nos CRM, ao fortalecer e uniformizar as
atividades de fiscalização de serviços médico-hospitalares. “Nosso
objetivo é definir o que é seguro em termos de infraestrutura,
equipamentos, insumos e até na quantidade de médicos necessários para
dar assistência correta à população. Estamos trabalhando para garantir a
honestidade da oferta dos serviços médicos ao povo brasileiro”,
detalha. O mesmo cuidado aconteceu com a edição de critérios semelhantes
para postos de saúde e consultórios.
O Manual definirá os portes das
instituições por capacidade de leitos e de acordo com a complexidade.
Também determinará os equipamentos e insumos mínimos para segurança do
ato médico e vai orientar sobre a infraestrutura exigida de
estabelecimentos de apoio diagnóstico, em hospital ou unidade autônoma,
institutos médico-legais e de verificação de óbito.
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