Ser médico ou cientista, eis a questão. Na dúvida, por que não os dois?
Angelo
Brito e Guilherme Rossi são jovens, talentosos e inteligentes.
Escolheram uma das profissões mais cobiçadas e valorizadas na
atualidade: a medicina. Seus ídolos são o inventor Thomas Edison, o
evolucionista Charles Darwin, o gênio Leonardo Da Vinci, os médicos
Paulo Vansolini, Leopoldo de Meis, Rudolph Virchow e José Lopes de Faria
– algo inusitado para quem tem apenas 22 anos de idade. Um sonho eles
têm em comum: ser cientista e descobrir a cura do câncer. Não à toa,
ambos desenvolvem pesquisas nessa área.
Guilherme procura moléculas chamadas de microRNAs que intermedeiam a
ação da quimioterapia e o desenvolvimento do câncer nos casos chamados
de indolentes – que não respondem ao tratamento. Angelo busca descobrir
os caminhos que levam ao desenvolvimento de novos vasos para a nutrição
do tumor, processo conhecido por angiogênese, mas na área de leucemia.
O incentivo para a pesquisa começou na graduação – já no primeiro ano
do curso de medicina – e levou-os para dentro de vários laboratórios de
pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. A visão
romântica do que é ser cientista começou a ruir em meio a tantos
processos, livros, artigos e técnicas que tiveram que aprender. As
dificuldades, no entanto, só fizeram aumentar ainda mais o desejo de
seguir uma carreira diferente e pouco conhecida: a de
médico-pesquisador.
No quarto ano do curso de medicina, ambos trancaram a graduação e
decidiram iniciar uma nova jornada com direito a diploma de doutorado,
oferecido pelo Programa Médico-Pesquisador da FCM da Unicamp. Uma
guinada e tanto na vida de quem até então ‘andava com a turma’, seguia
calendários, provas e tinha uma rotina de aulas preestabelecida.
“Da noite para o dia, você deixa de ser o aluno de medicina e passa a
ser aluno de pós e tem que aprender a lidar com a liberdade e a fazer
tudo sozinho. É um choque de realidade. Você fica maduro, independente e
até mais humilde”, diz Angelo Brito que é o primeiro aluno a ingressar
no Programa Médico-Pesquisador, conhecido como MD-PhD.
Guilherme Rossi começa o MD-PhD em 2014 já considerando a experiência
do amigo e sabe que tudo vai depender dele daqui para frente. Por dois
anos, ele vai se dedicar ao sonho de criança. Após esse período, ele
volta para a graduação e conclui o curso de medicina. Em oito anos –
seis de graduação e dois de pós – ele fecha um ciclo de estudos que
normalmente seria de 12 anos ou mais, se escolhesse fazer
residência-médica primeiro.
“O pesquisador é aquele que está na fronteira do conhecimento,
procurando descobrir algo que ajude os outros. O jovem tem a mente
aberta e mais pique para ler, participar de congressos e grupos de
pesquisa. Quanto antes começar a pós, melhor. Eu quero aprender e
ensinar”, revelou Guilherme.
Segundo o coordenador da pós-graduação da FCM, Licio Augusto Velloso,
o Programa Médico-Pesquisador é para poucos. Pelos menos 95% dos alunos
querem ser médicos com atuação clínico-cirúrgica e apenas entre um a
três alunos, por turma, tem o perfil voltado para a atividade médica de
pesquisa. Para esses alunos, a FCM criou o Programa Médico-Pesquisador,
em 2010, na administração do professor José Antonio Rocha Gontijo e do
diretor-associado Gil Guerra-Júnior. O modelo é similar ao
norte-americano. No Brasil, apenas a Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ) oferece o curso há trinta anos. A Escola Paulista de
Medicina tem uma modalidade um pouco diferente. A Unicamp, portanto, é a
terceira.
“O MD PhD é para aquele aluno que gosta de medicina, mas que tem um
pergunta a mais: como a doença se desenvolve ou como melhorar o
tratamento. E só tem um jeito de responder: pesquisando”, disse Velloso.
A cada ano são oferecidas duas vagas. O orientador de iniciação
científica é quem identifica o aluno que tem potencial, “aquele que vem à
noite, aos finais de semana e trabalha mais que a média”. Mas tem a
parte do aluno interessado, que deve se candidatar, preparar o memorial,
não ter reprovação na graduação e escrever um projeto de pesquisa. A
última etapa é a entrevista.
“O Programa é uma estratégia administrativa da FCM para melhorar
aquilo que ela já oferece de bom. Estamos abrindo caminho para formar
melhores médicos-pesquisadores. No futuro, isso irá repercutir
positivamente”, disse Velloso.
Uma coisa Angelo e Guilherme sabem: não querem ficar atrás de uma
mesa de consultório ou fazer residência médica, o que é a tendência
natural da carreira de médico. Ambos querem estar na Universidade,
produzindo conhecimento novo e, quem sabe, dando aula para novos alunos.
“Eu decidi que seria melhor investir na pós-graduação. Tem que
querer. A gente supera as dificuldades. Quero, um dia, ser professor e
pesquisador aqui na FCM”, revela Guilherme.
“Pode ser que eu passe 40 anos estudando o câncer e não chegue a uma
descoberta que vai ser capa de revista ou capítulo de livro, mas se eu
construir nem que seja uma frase, terei contribuído muito para o
conhecimento e isso vale a pena”, disse Angelo.
Fotos: Marcelo Oliveira - CADCC/FCM-Unicamp
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