quarta-feira, 27 de abril de 2011

Humanização da Medicina

As novas disciplinas para formar um médico melhor

 



Estudantes de medicina ao redor do mundo estão aprendendo a escrever histórias sobre experiências vividas com os pacientes, como se fossem escritores. A atividade é um exercício típico de uma nova disciplina, a medicina narrativa, que já faz parte do currículo de escolas médicas como Columbia, Massachusetts e Nova York (EUA). A matéria se dissemina também por escolas do Reino Unido e será tema de um seminário na Argentina em junho. Ela é a opção encontrada por essas universidades para dar mais peso às ciências humanas no curso de medicina.
A nova prática se vale dos textos escritos pelos estudantes ou médicos formados e da discussão de filmes, livros e teatro relacionados à saúde. O propósito é oferecer um canal de expressão para compartilhar sentimentos e refletir sobre eles. “Ao reler o que foi escrito, é comum a pessoa fazer descobertas sobre o modo como vê o paciente e a sua situação”, disse à ISTOÉ Rita Charon, da Columbia University. Também Ph.D. em literatura, ela idealizou essa metodologia. “Às vezes, basta perguntar ao estudante como estava seu humor enquanto escrevia para dar a ele uma chave para rever aspectos da sua prática clínica”, diz Rita.
Desse modo, espera-se criar condições para que os profissionais da saúde tenham uma visão mais completa do paciente, levando em consideração características da sua vida, cultura e temperamento. “Queremos que os médicos da nova geração ouçam atentamente os pacientes e lidem com eles com sensibilidade”, diz Rita, que incorporou a medicina narrativa à sua prática. “Tomo notas sobre o paciente. Mas depois mostro a ele o que anotei e peço que me escreva de volta. Frequentemente isso revela aspectos do cuidado com o doente que eu não saberia de outra forma”, diz.
Na Brown University, a escrita reflexiva é obrigatória no primeiro e no segundo ano de curso. Na Columbia, ela permeia todo o curso. Aqui, a medicina narrativa ainda não está na pauta das universidades. “Estamos atrasados. Para se ter uma ideia, há escolas que nem sequer incluíram as aulas de bioética no currículo”, critica Cláudio Cohen, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. “A medicina é também uma ciência humana. Se não dermos atenção a essa dimensão do ensino, continuaremos formando médicos como quem educa engenheiros”, diz Cohen.
Em compensação, há por aqui boas iniciativas em sintonia com o movimento de humanização do ensino de medicina. Uma delas é o programa Sorrir é Viver, criado na Faculdade de Medicina do ABC (SP). O projeto oferece aos estudantes oficinas de técnicas circenses e teatrais e promove rodas de leitura. “Ampliei minha com¬preensão do que significa a doença na vida de alguém e passei a entender melhor o que sentem os pacientes depois de visitá-los como palhaça”, explica a quartanista Gabriela Garcia, coordenadora do programa.
Semanalmente ela vai aos hospitais e unidades de saúde do Grande ABC na companhia de outros estudantes-palhaços. O mesmo projeto oferece oficinas para alunos que querem aprender a contar histórias para crianças internadas e criou um grupo de discussão de textos literários que envolvem questões de saúde e doença.
Convidar os estudantes para assistir a um bom filme e depois conversar sobre o sentido do que foi visto é a proposta do MedCine, programa criado na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. No projeto, são realizadas sessões de cinema uma vez por mês, com debatedores convidados para analisar as ideias contidas nas películas selecionadas. O filme “O Enigma das Cartas”, de Michael Lessac, por exemplo, trouxe o debate sobre ao autismo. Já “Bicho de Sete Cabeças”, de Laís Bodansky, permitiu uma discussão sobre o atendimento psiquiátrico no País. “É uma forma de abordar questões do dia a dia dos estudantes da área da saúde sob diversas perspectivas”, diz o psiquiatra Marco Túlio Aquino, coordenador do programa.

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