Fernando Reinach*
A cada ano aumenta a expectativa de vida do ser humano. Novos remédios, dieta saudável e medidas preventivas estão aumentando a expectativa de vida em muitos países. Mas como serão vividas as últimas décadas dessa incipiente população de nonagenários? Otimistas acreditam que é possível viver mais de noventa anos com saúde física e mental, independência e liberdade. Pessimistas temem que o aumento na expectativa de vida produza uma população crescente de idosos dependentes de equipamentos médicos, atrelados a máquinas, fisicamente frágeis e mentalmente afetados por doenças degenerativas do sistema nervoso. Se esse for o caso, vale pena viver esses últimos anos?Felizmente esse problema está sendo investigado cientificamente. Em 1998 a Dinamarca identificou todos os habitantes nascidos em 1905 e, na época da pesquisa, tinham 92 anos completos. Todos foram convidados a participar de um estudo em que saúde física, mental e qualidade de vida seriam avaliadas periodicamente. Praticamente dois terços dos idosos concordaram em participar do estudo. No total, 2.262 pessoas. Eles foram reavaliados no ano 2000 e isso foi repetido em 2003 e 2005, quando o grupo atingiu os cem anos. Somente 166 das 2.262 pessoas atingiram um século de idade. É tão difícil chegar aos 92 quanto sobreviver dos 92 aos cem anos. O estudo permitiu descobrir como essas pessoas viveram seus últimos anos.A pesquisa investigou como as pessoas moravam, se tinham vida independente ou se viviam em casas de idosos ou asilos. Verificou grau de independência, capacidade de ir às compras, de caminhar e subir escadas. Mediu a força que tinham nas mãos, a capacidade cognitiva, a capacidade de dialogar e organizar os pensamentos, a memória e o estado psicológico. Descobriu quantas tinham depressão e se sofriam de solidão. A cada ano, os exames e entrevistas foram repetidos. Apesar da amostra pequena, do fato de muitas pessoas terem morrido durante o período analisado e levando em conta que essas pessoas sobreviveram a duas guerras mundiais e cresceram em uma época em que o fumo ainda era prevalente na Dinamarca, o estudo é provavelmente o mais completo já publicado.Os resultados são surpreendentemente encorajadores. O que foi observado é que a maioria das pessoas no grupo viveu de maneira independente e com boa saúde física e mental até os últimos meses de vida. A deterioração da saúde física ocorreu de maneira rápida e levou à morte em poucos meses. Os períodos de hospitalização foram relativamente curtos. Apesar de o estudo não ter analisado os custos desses últimos anos de vida para o governo da Dinamarca, tudo indica que os gastos maiores foram feitos nas poucas semanas anteriores à morte. Os resultados sugerem que - ao menos na população da Dinamarca nascida em 1905 - pessoas que sobrevivem até idades muito avançadas não têm uma qualidade de vida muito diferente de seus compatriotas de 70 ou 80 anos.O estudo precisa ser repetido em outras populações, mas tudo indica que o receio que os progressos da medicina acabem por criar uma população de idosos debilitados e infelizes parece não se justificar.
*Biólogo - fernando@reinach.com
Mais informações em:
Exceptional longevity does not result in excessive levels of disability. Proc. Nat. Acad. Sci., vol. 105, pág. 13.274, 2008
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